“Marmelada de banana, bananada de goiaba
Goiabada de marmelo
Sítio do Pica-Pau amarelo Sítio do Pica-Pau amarelo...
Boneca de pano é gente, sabugo de milho é gente
O sol nascente é tão belo
Sítio do Pica-Pau amarelo Sítio do Pica-Pau amarelo...
Rios de prata, pirata Vôo sideral na mata, universo paralelo
Sítio do Pica-Pau amarelo
Sítio do Pica-Pau amarelo...
No país da fantasia, num estado de euforia Cidade polichinelo Sítio do Pica-Pau amarelo...”
Não há como negar que as canções infantis como a de autoria do cantor Gilberto Gil, “Sítio do Pica-Pau Amarelo”, ainda ecoam na memória e coração de muitos adultos, que passaram suas infâncias a se aventurar com a Emília, Narizinho, Pedrinho, Visconde de Sabugosa e outros personagens criativamente montados pelo escritor Monteiro Lobato, para uma das obras mais originais da literatura infanto-juvenil no Brasil.
No entanto, para muitos jovens nascidos na era da tecnologia, a boneca de pano não é atraente, o milho falante não tem graça e o sítio mágico simplesmente não reluz. Esse é o caso do estudante Douglas Fernando Perez, que desde cedo pôde optar por maneiras diferentes de se divertir. O jovem de 14 anos até chegou a brincar do tradicional futebol de rua quando criança, mas logo trocou a prática pelo virtual. “Os jogos eletrônicos são bem mais legais que as brincadeiras na rua, pois o entretenimento é maior e exige mais raciocínio”, afirma. Apesar de parecer normal, por ser influenciada pelas novas tecnologias do século, ainda existem muitas dúvidas quanto aos benefícios dessa transição na educação das crianças.
Para a psicopedagoga e colunista do site Mércia Falcini, ao lembrar da liberdade das brincadeiras nas ruas, que ofereciam menos recursos, mas mais desafios à criatividade, não se pode esquecer que tudo está associado aos valores de uma determinada época.
“As brincadeiras de infância são reflexos do contexto sociocultural. Por isso, as brincadeiras de hoje são diferentes das de antigamente. Assim como o comportamento humano, as brincadeiras também sofrem constantes transformações”, explica.
Mércia ainda ressalta que as brincadeiras não são naturais ou espontâneas; são fundamentalmente culturais. “Se julgamos as brincadeiras de hoje mais agressivas ou mais individualistas, assumimos assim a nossa forma de viver: também individualista e agressiva”, concluí.
Apesar de os jogos eletrônicos serem motivos de muita polêmica no campo da educação por criarem um mundo virtual onde não há punição aos atos da criança, como diz a pesquisa realizada pelo Laboratório de Estudos em Ética nos Meios Eletrônicos (Leeme) da Universidade Mackenzie em 2010, a psicopedagoga acredita que o recurso possa ser um forte componente educativo, desde que haja uma mediação adulta.
“O processo educativo depende da mediação, por isso, nunca e jamais nenhuma tecnologia ocupará o lugar do educador. Um computador, acessado a Internet ou não, abre um campo imenso de possibilidades de aprendizagens positivas ou negativas. O sucesso depende da intervenção e intencionalidade de um adulto”, conta.
Porém, nem todos os pais exercem essa mediação de aprendizado dos filhos. Esse é o maior problema apontado por Mércia. “Sem a mediação, nem o livro didático desempenha função educativa”, afirma.
Aprender brincando
Os pesquisadores Jean Piaget e Henri Wallon foram grandes defensores da brincadeira, como elemento fundamental ao desenvolvimento da inteligência. Piaget diz que a brincadeira é o berço obrigatório das atividades intelectuais da criança. Muito mais que um desafogo ou entretenimento para gastar energia das crianças, as brincadeiras são meios que contribuem e enriquecem o desenvolvimento intelectual. A ludicidade seria o primeiro estágio da aprendizagem, brincando as crianças constroem a base para aprendizagens mais complexas. Emocionalmente, a brincadeira contribui para resoluções de conflitos e enfrentamento das emoções. Em muitas situações, a brincadeira ensaia a vida adulta e com isso ajuda a criança a enfrentar sua vida futura. “Não é à toa que o ditado popular é perpassado de geração a geração para justificar as brincadeiras de infância: Criança que brinca, adulto que trabalha”, lembra Mércia.
Segundo ela, é interessante ainda entender a relação entre brinquedo e brincadeira. O brinquedo estimula a brincadeira ao abrir possibilidades de ações. Assim, se desejamos transformar as brincadeiras, devemos primeiro refletir que brinquedos oferecer aos nossos pequenos. O que o brinquedo reflete e como o reflete?
No entanto, os cuidados dos pais não param por aí. “A infância é a fase de maior responsabilidade deles. Como diz a escritora Lya Luft, quando enfatiza a importância do afeto vivenciado na infância. Somos marcados pelo olhar profético que nos lançam em pequenos, como a maldição das fadas nos contos infantis. Com essas palavras, digo sem medo de errar, os filhos precisam ser amados e desejados”, salienta Mércia.
Uma boa escolha
Se deixar brincar ainda é uma maneira benéfica de ajudar na educação das crianças, nada como oferecê-las opções para que possam entender que o antigo também se moderniza e o atual um dia será passado. Desta forma, ficará mais fácil compreender porque a magia de um sítio amarelo atravessa gerações e continua encantando, seja nas páginas dos livros ou nas telas dos sites.
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